"Amar eu posso até a hora de morrer.
Amar não acaba. É como se o mundo
estivesse à minha espera. E eu vou
ao encontro do que me espera"
ao encontro do que me espera"
(Clarice Lispector)
O medo lhes denunciava. Poderia ser sentido à quilômetros de distância, o que é exatamente a distância que há entre um e outro neste exato momento.
Acordou. Estava cansado. Havia dormido pouco, que a noite fora de longas conversas. Hoje seria o dia. Pensava em Clarice dizendo "E eu vou ao encontro do que me espera".
Foram tão parcos dias, tão miúdos. Ainda assim tão cheios de coisas, de pequenitos detalhes, que a mesma quantidade de dias não seria suficiente para que descrevesse o que falaram, o que sentira, o que achava que o outro sentira... E hoje era o dia.
Tudo estava certo. A mala por sobre a cama. A passagem no bolso do paletó, os documentos, enfim, tudo que lhe era necessário. Apenas a calma lhe faltava, que a ânsia de encontrar com o que nos espera é uma das piores quando é o acaso que une as pessoas.
Assim sendo, viajou. Cada quilômetro de distância fora percorrido, o coração na mão, mesmo que, ao mesmo tempo, cheio de felicidade. Felicidade é essa coisa estranha que nos abre o peito e faz dele vazar tudo que de ruim há, deixando apenas aquilo que de bem nos serve.
Assim sendo, chegou à cidade e foi para o local combinado para o encontro. Estava com amigos e entre uma bebida e outra, falavam sobre a casualidade da vida, ao que ele disse:
- Como é o acaso! Penso agora sobre o acaso e é este o assunto que vocês iniciam na mesa!
E as horas passavam.
Acontecia que do outro lado da cidade, o outro hesitava. É que tinha compromissos. Talvez fosse melhor cumprí-los (ou seria, honrá-los?), ele pensava, tentando encontrar a resposta correta para a pergunta. Não se tratava de compromissos consigo mesmo, mas com outrem, um terceiro.
Se soubesse que o outro hesitava, nosso viajante diria: E que compromisso é maior senão o compromisso que temos com aquilo que sentimos?, mas não teria esta oportunidade. Falar não lhe seria permitido hoje caso o rapaz não aparecesse.
Sem saber que respostas certas para a questão que se fazia não existia, o rapaz do compromisso refletia cada vez mais e pensava em todas as possibilidades de final para esta história.
Foi assim que o medo lhes denunciava. Poderia ser sentido à quilômetros de distância, o que é exatamente a distância que há entre um e outro neste exato momento. De lá, um hesitava por conta de outro, de cá o outro temia porque a hora já ia avançada e nem sinal do rapaz. E de cá eu me despeço, que o desfecho para esta história, ninguém ainda sabe. Tudo o que sabemos é que o medo tem dessas nuances: é um grande artífice... Faz-nos crer que não desejamos nosso desejo, que desanimamos de nossos propósitos, que queremos cuidar do outro mais do que de nós mesmos.
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