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terça-feira, 31 de julho de 2007

Last Goodbye

This is our last goodbye
I hate to feel the love between us die.
But it's over
Just hear this and then I'll go:
You gave me more to live for,
More than you'll ever know.

Well, this is our last embrace,
Must I dream and always see your face?
Why can't we overcome this wall?
Baby, maybe it's just because I didn't know you at all.

Kiss me, please kiss me,
But kiss me out of desire, babe, and not consolation.
Oh, you know it makes me so angry 'cause I know that in time
I'll only make you cry, this is our last goodbye.

Did you say, "No, this can't happen to me"?
And did you rush to the phone to call?
Was there a voice unkind in the back of your mind saying,
"Maybe, you didn't know him at all,you didn't know him at all,oh, you didn't know"?

Well, the bells out in the church tower chime,
Burning clues into this heart of mine.
Thinking so hard on her soft eyes, and the memories
Offer signs that it's over, it's over.

segunda-feira, 30 de julho de 2007

Ah! Tenho que dizer

Gente, sei que isso não é texto que se publique... Mas é que preciso.

Cheguei tarde do trabalho hoje. Ouvindo "Cocteaus Twins", "Wax and Wane". Deitei na cama. Soltei o corpo pesado do dia de trabalho e aí veio uma vontade doida de dizer isso que digo agora:

- Lucas e Magrela, amo muito vocês!!!!

Da paixão pela idéia ou Sobre o Opção Deliberada pelo Platonismo

Os olhos vidrados pela janela. Esquadrinhavam o exterior, a rua, as pessoas. Tudo viam, sem nada ver. Sem ver aquilo que queriam.
Curioso como o mundo se nadifica para que salte aos olhos aquilo que o coração quer ver. Pela janela, o mundo nadificado, o nada sobressaía. Até então não havia encontrado o que procurava.
- Por favor, o senhor poderia dobrar naquela rua? - pediu ao motorista do táxi.
A corrida já se delongava. O dinheiro ainda daria, mas era preciso vigiar o taxímetro que, aos poucos, comia-lhe a esperança de encontrar o que procurava pelas ruas da cidade.
Era um desconhecido ali. E aquele lugar, aquela cidade, aquelas ruas, também eram suas desconhecidas. Tudo era novidade, menos aquilo que trazia dentro em si ao sair de onde morava para aquele lugar estranho.
- Senhor, o senhor procura algum lugar específico? - perguntou o taxista. Talvez possa lhe ajudar... Algum hotel? Alguma loja? Empresa?...
- Não, procuro uma pessoa, mas imagino que o senhor não conheça... - era puro demais de coração e, acostumado ao mundinho pequeno do lugarejo onde conhecera a menina, pensava que em qualquer lugar do mundo todos eram conhecidos uns dos outros, todos confraternizavam-se. Idéia mais absurda era pensar que no mundo, em que toda a gente era igual a toda a gente, as gentes não se conheciam e não se davam atenção!
- É, realmente acho difícil...
- Bem, chama-se ---.
- É que aqui é muito grande, senhor. Há tantas pessoas com esse nome que o senhor seria incapaz de fazer as contas!
- Olha, ela me disse que trabalhava com coisas de televisão...
- O senhor sabe ao menos onde mora esta pessoa?
- Ah! Sim! Sei que mora numa rua com árvores, num desses prédios que as pessoas dividem o espaço e moram apertadinhas.
- Entendo... - respondeu o motorista olhando em estranhamento pelo retrovisor. De onde saíra aquele rapaz? Não importa! Fato é que desconhecia o mundo. - Onde a conheceu?
- Na minha cidade. Ela estava lá... Fora conhecer as coincidências da vida, me disse. Contou que um dia estava lendo um livro desses que se lê na faculdade e que pensava, desde que começara a folhear as primeiras páginas, num nome. "Guarapiúna", ela disse. É o nome de minha cidade. E a tal história do tal livro se passava exatamente lá. Agora veja! Um livro que fala daquele canto de mundo... E começou a ler o livro mais avidamente, então, já que adivinhara o nome do lugar onde se passava a história.
- Vá ver já tinha ouvido falar que o livro se passava na tal cidade. E vai ver é por isso que quando pegou o livro pra ler, a primeira coisa que lhe veio à cabeça foi o tal nome. Mas é que se esqueceu e daí a sensação de coincidência...
- É... Pode ser. Mas no mesmo dia, me contou que foi pra uma festa com as amigas. E lá chegando, conheceu essa menina no balcão do bar da boate. "Guarapiúna, prazer. E você?", lhe disse a menina. O senhor há de concordar: é muita coincidência...
- Pois é. Coisas da vida, né?
- E aí foi conhecer a cidadezinha. Chegou lá numa tarde de sexta-feira. E passou o final de semana. Chegou com uma mochila pesada nas costas. Livros. É dessas que gostam de ler. E eu estava bem no ponto bem na hora que ela desceu do ônibus. A mochila arrebentou de tanto peso. E ela se abaixou para catar todas aquelas coisas... Roupas e livros. E o primeiro que segurou era "Laços de Família", não sei se o senhor conhece... É o único livro que li em toda minha vida, o senhor não vai acreditar! - os olhos ainda vidrados na rua enquanto ia conversando, ainda a procura da menina. - Não acredito em destino, mas numa situação dessas a gente até se questiona...
- Pois é...
O taxímetro chegava ao valor limite. R$50. Era tudo o que ele tinha para gastar naquela hora. No mais, apenas o dinheiro para se alimentar até o final do dia e para voltar para a rodoviária e pegar o ônibus. A passagem de volta, já comprada, ia no bolso da calça, para que pudesse sempre se certificar de que não a tinha perdido, colocando a mão por sobre o bolso para sentir o papel dobrado ali dentro.
- Senhor, o senhor pode encostar. Vou descer aqui.
- OK.
Parara em frente a uma grande magazine. Tudo naquela cidade era grande. Os prédios. As lojas. As avenidas. Andando pelas ruas lentamente, olhos em riste a procura da menina, começava a desanimar de sua busca. Sim, era melhor admitir: nunca a encontraria...


A tensão aumentava a medida que ia dando seus passos em direção ao desconhecido, que era tudo a seu redor. Não estava acostumado com tantas pessoas pela rua. Não estava acostumado a não ser ninguém em meio à concretude dos prédios e carros.

Os ombros, outrora erguidos, iam aos poucos caindo. O rosto, exultante em excitação, perdia as feições de alguém em busca de seu desejo mais profundo. Até mesmo a clareza que tinha quanto aquilo que sentia ia se esvaindo a cada rua, a cada pessoa por que ele passava.

Duas horas depois, um lanche rápido - o que lhe renovara as energias - e um papo rápido com o rapaz sentado ao seu lado na lanchonete, caminhava novamente pela rua e avistara lá adiante... Seria ela? O cabelo era parecido. O modo de andar. Cada um dos movimentos... Não ficara muito tempo com a menina. Apenas todos os dias de um final de semana. O suficiente para acreditar conhecê-la, o suficiente para arriscar e sair de sua cidade em busca do que desejava.

Apressou o passo. Sim, era ela. Havia de ser ela. Muito parecida. E seria, mais uma vez, a coincidência, aquilo que tanto conspirara a favor do primeiro encontro de ambos, que lhes faziam esbarrarem-se numa cidade tão grande como aquela?

Já próximo, quase podendo tocá-la nos ombros, exclamou:

- ---!

Ela virara o rosto espantada. Algum conhecido? Sim, ao menos ouvira seu nome.

Ele lhe acenava. As mãos para cima. Em profundo êxtase, acenava para a menina. Por fim, haviam se encontrado... Mas... Não... Não era ela que vinha ao seu encontro de braços abertos... Não era ela! Vira a menina abrindo os braços e o sorriso, mas não era ela! Vira a menina se aproximando para um abraço. Talvez um beijo... Mas não era ela!

Fechou a cara e, desviando-se do abraço, partira em disparada para o ponto de ônibus mais perto.

- Por favor, o senhor sabe me dizer o número do ônibus para a rodoviária? - perguntara e, recebendo a indicação, entrara rapidamente no ônibus. Ainda pudera ver, lá de dentro, a cara de estupefação daquela menina. Muito parecida com a sua ---, mas não podia ser ela.

E voltou para casa, apaixonado pela idéia que negara-se ser frustrada pela realidade. Voltara para casa, o peito extravasado em dor pela idéia de --- que quase se perdera naquele breve encontro com... ela?

quarta-feira, 25 de julho de 2007

Kiss me! Please, kiss me! But kiss me out of desire, baby, and not consolation!

(Jeff Buckley - Last Goodbye)



Se vejo na rua um deficiente e seus passos lentos, meu pensamento não deixa de pensar que devagar se chega longe. Sinto-me mal com este pensamento. Descaso com a desgraça alheia? É que há tantas desgraças! e nenhuma, de fato, é alheia.


Tento desviar o pensamento, mas me esqueço que quando caio na deficência do velho em seu caminhar já é desvio. Tudo são desvios.

A vida é uma burocracia chata. E adoro preencher seus papéis, assinar. Me falta o carimbo, contudo. A validação. A certeza da aceitação, com protocolo e assinatura do recebedor.

Queria saber da vida grandes coisas. Mas tudo o que sei é que ela é burocracia pura. As etiquetas. As relações. A boa-educação. Pudera mandar tudo isso para o inferno, mas já não teria uma vida, pois fugiria da burocracia que ela, em si mesma, é.

Uma vida desburocratizada é uma vida de compromissos solipsistas e fujo de mim. Prefiro preencher a papelada e requisitar meus documentos a arriscar encarar a mim mesmo e apenas. Prefiro ter a certeza de poder encarar os outros e deles cobrar as respostas certas.

terça-feira, 24 de julho de 2007

O viandante

Quero perder-me de mim e no perder-se, deixar-me ver a mim mesmo, como que distante.

O que veria?

Imagino que veria um viandante. E que este ia errante pela estrada. Uma estrada longa, um pouco sinuosa, mas que tinha sempre um mesmo caminho, uma mesma direção: adiante. E que nessa estrada, veria o viandante zigue-zagueando, em busca de troncos e coisas seguras na beirada, coisas a que pudesse se prender e tomar como garantias, parando assim de caminhar.

Mas se parasse de caminhar, não seria viandante. E sabia-se viandante. Foi por isso, por saber-se sem saber que sabia-se, que deu-se conta um dia de que não era necessário correr para as margens em busca de algo a que pudesse se prender: bastava caminhar e ir conhecendo estas coisas que lhe passavam pela lateral, relacionar-se com as coisas e deixá-las seguir o rumo próprio ao passo que ele mesmo seguia o seu.

Foi assim que decidiu (e isso, posso ouvir e precisar o momento exato em que ouvi): Vou deixar-me viver.

Viu passarem árvores, troncos, pequenas ramagens, pedregulhos. Aproximou-se deles. Deixou-se ali ficar. E partiu, sem medos, sem arrependimentos.

Foi quando lá na frente, bem lá na frente na estrada, avistou uma grande lagoa.

Apressou o passo para chegar mais rapidamente ao lugar, tão interessante e certo visto assim de longe.

Lá chegando, avistou toda a extensão daquele lago, dando-se conta de que não se tratava de um lago, mas apenas de um grande rio que passava por ali. Aquele amontado de água que vira lá de longe era nada mais que um remanso do rio que, lenta e placidamente, seguia seu rumo em busca da foz onde, um dia, de fato se entregaria e de fato se deixaria ficar.

Nosso viandante, outrora decidido a não aprisionar-se a nada que lhe aparecesse no meio do caminho, decidira deixar por um instante suas bolsas e despojar-se de suas vestes e banhar-se tepidamente nas águas plácidas e limpas do rio.

Aquela água era tão prazenteira. O modo como lhe tocara o corpo num primeiro instante, fazendo os pêlos eriçarem-se e pequenos calafrios subirem pelo dorso. E o modo como ela, a água, tirara dele as sujeiras que lhe embaralhavam as vistas, deixando-o ver a estrada que ele deveria seguir de modo mais claro.

Aquela água, tão prazenteira, fizera o viandante querer prender-se novamente a algum lugar. Mas e sua decisão anterior? De que lhe valeria se se deixasse ficar ali, abandonado às margens do rio?

Decidiu então por um dia entregar-se ao rio. Como seria? E passou toda a extensão de um dia banhando-se naquelas águas.

Ao final desse dia, porém, deu-se conta de que a água que por ele passava, passava e segui seu curso, em busca da tal foz a que se entregaria no fim. Não era o mesmo rio, o filósofo já lhe alertara um dia, não era a mesma água; quiçá aquela ali era a mesma margem, que a brisa leve carregava folhas e um pouco da terra.

Assim, nosso viandante despediu-se do rio, vendo toda aquela água deixar-se ir pelo portão formado pela margem na parte em que se estreitava, cinco metros mais abaixo de onde ele e o rio haviam se encontrado e sido cúmplices.

Vestira sua roupa, pegara suas bagagens. Hoje, tenta andar novamente pela estrada, resistindo de novo e a cada segundo ao desejo de retornar ao remanso regozijante do rio que segue.

A imitação de Machado

Face aos últimos acontecimentos, pensava ensimesmado:

.
...
.
?
.
???
!??!
?!
.
...!
?...
...;...;...

E tentava encontrar as definições que lhe eram tão caras. Mas não havia nada que pudesse lhe dar a certeza, que a vida são incertezas que constituem.

segunda-feira, 16 de julho de 2007

Twentysomething

Ouvindo músicas enquanto conserto erros em planilhas do Excel no trabalho (sim, dizem que é preciso muito conhecimento em Psicologia para isso...), Jamie Cullum, esse jazzista inglês, começa a cantar.

Sabe como é... Enchemos o computador com música e nunca damos muita atenção a tudo o que temos. Gosto da voz dele desde a primeira vez que ouvi. As músicas, bem, uma ou outra é nova, mas ele tem esse jeito de trazer as antigas de um jeito bom (não melhor, mas bom).l

ENtão ele começa a cantar essa música que dá nome ao álbum, "Twentysomething". Não sei, mas acho que o nome pra isso é "identificação", ou "projeção"? Aliás, quando termina a projeção e começa a identificação e vice-versa...?

After years of expensive education,
a car full of books and anticipation,
I’m an expert on Shakespeare and that’s a hell of a lot
but the world don't need scholars as much as I thought.

Maybe I'll go travelling for a year,
finding myself or start a career.
I could work for the poor though I’m hungry for fame
we all seem so different but we're just the same.

Maybe I'll go to the gym, so I don't get fat,
are things more easy with a tight six pack?
Who knows the answers? Who do you trust?
I can't event separate love from lust.

Maybe I’ll move back home and pay off my loans,
working nine to five answering phones.
Don't make me live for my friday nights,
drinking eight pints and getting in fights.

I don't want to get up, just let me lie in,
leave me alone, I'm a twenty something.

Maybe I'll just fall in love that could solve it all,
philosophers say that that’s enough,
there surely must be more.

Ooooh Love ain’t the answer nor is work,
the truth alludes me so much it hurts.
But I’m still having fun and I guess that's the key,
a twenty something and I'll keep being me.

domingo, 15 de julho de 2007

A carta de (des)amor

Cansei desse jogo e de suas palavras. Das regras subentendidas. Já não te ligarei mais ou tentarei qualquer contato. Prometo: esta é a última vez que me dirijo a você, quando a necessidade se faz presente pela objetividade.
O que houve entre mim e ti ficará sempre como uma lembrança. Indelével é a marca daquilo que se vive. Só o que não vivemos é que podemos esquecer, como um desejo recalcado: nunca esquecimento de fato, mas ainda assim um modo de não lembrar.
Já não sou mais quem você disse amar. Já não sou mais quem te amou um dia, naquele dia em que, como uma criança cansada do pique-esconde, decidi sair do esconderijo e fazer-me aberta; quando me coloquei a teus pés, desnudei-me inteira diante de seus olhos e mostrei-te o que tenho de mais íntimo. Meus sentimentos expostos e suas respostas escarradas sobre mim.
E ainda tentei contato algumas vezes. Diga: porque não atendeu sequer uma vez para me dizer que não queria? Isso faz parte desse jogo ridículo de adultos? Nos jogos de adulto jogo como uma criança.
Lembra-se do primeiro dia? Andando pela grama do aterro como se não existisse mais nada além de nós. E o sol, testemunha do momento, nos corando a pele. A brisa do mar. "Sinto frio", eu disse. Era apenas a deixa para o abraço... E para o beijo que veio depois, que viria a ser apenas o ensaio para o amor, aquele amor ridículo do final do dia, mas que me deixava satisfeita como mulher e como sua amante.
Mas escrevo-lhe apenas para dar direções. É que ainda há coisas suas em minha casa. Sabe que careço de espaço por lá. Por favor, passe para buscá-las, deixarei na portaria com o senhor que fica lá pela manhã.
Os CDs ficam comigo. Aquelas bugingangas da feira de antigüidades também. Estive lá outro dia e aquela senhora da barraca de vinis lembrou-se de mim e perguntou por ti.
Quando precisar, pode bater a minha porta. Não negarei atenção, como tem feito. Penso "talvez ele não precise disso", mas tenho necessidade de dizer.
Ana, aliás, encontrou comigo por esses dias na rua e perguntou como tenho estado. Fui sincera. Espero que ela não tenha lhe incomodado com minha vida. Por via das dúvidas, decidi parar de responder a seus amigos. Alguns ainda me mandam e-mail. Não sabem do fim?
Enfim, quando me olho no espelho, não vejo a mesma. Queria olhar-me e ver aquela que sabia amar, mas o amor romântico ficou preso no século XVIII. Sempre acreditei ser capaz de transpor o tempo, mas aprendi (e isso devo a você) que isso não é possível. Perdi, com você, a capacidade de amar. E há quem diga que isso foi, na verdade, a melhor coisa que ganhei com esta relação...
Por fim, desejo-lhe o melhor: que um dia, ao menos um dia em toda a vida, consiga olhar para alguém e dizer realmente o que você sente, sem precisar daquelas piadas de que só você acha graça.
Com afeto,
Beatriz

quarta-feira, 11 de julho de 2007

Sobre pessoas e pessoas

As coisas são várias. É como dizem: há filmes e filmes. Eu assistiria a trilogia do Iñarritu novamente, mas não veria a trilogia das cores do Kieslowski. Mas eu veria "Inferno", legado deste último, que até do mesmo idealizador há filmes e filmes.


Assim como vejo "The Wall", do Alan Parker, a cada vez que me convidem, mas evito ver "Evita" e nem tenho nada contra a Madonna.


Há músicas e músicas. Músicos e músicos. Pintores e pintores. Livros e livros, bem como autores e autores. Sendo assim, certo é que há pessoas e pessoas e todo o texto até aqui parece clichê.





Era uma vez uma terra muito, mas muito distante mesmo, em um lugar em que nem se imaginava possível ainda haver vida. Lá, nesse lugar, havia vida. Havia essa pequena família de agricultores. Conheciam tudo muito bem. As estações do ano; as horas de acordo com a posição do sol; o ciclo de migrações dos pássaros canoros; a data exata da queda das folhas da Gertrudes, a mangueira do jardim; o momento exato em que o filho mais novo da família se apaixonava pela chuva a cada vez que a via cair do céu com aqueles olhos reluzentes e com o nariz fungando o cheiro de terra molhada; a hora em que o avô ia falar à mesa, que era a hora de todos calarem-se; o momento em que o pato assado de domingo estava pronto, que era o mesmo tempo em que a gata Dinorá saltava do alto do galinheiro, onde vigiava atentamente o movimento das galináceas, e ia dar miando debaixo da cadeira do pai. Sabiam quando Dora menstruava, que a menina, muito faceira, trazia sempre nessas datas um olhar trigueiro e culposo no rosto, como se houvesse cometido o crime mais delicioso que fosse possível a uma mulher. E sabiam o que era possível a uma mulher: cozinhar, limpar a casa, lavar a roupa e as louças, enfim, tudo que dissesse respeito ao cuidado familiar, tudo aquilo que fazia-as ter orgulho de serem mulheres e poderem, como que por graça divina, cuidar daqueles que chamavam, ao cair da tarde, de "meu homem".


Sabiam da vida. Como viram os dali partir. Sebastião, a esposa e os cinco filhos; Quinzinho da venda e sua bicicleta Nara; D. Maria das Dores, já idosa, levada para o asilo pela filha mais velha que morava na cidade grande desde bem mocinha; Ângela e suas meninas do "centro de lazer"; Sêo Geraldo, os filhos, netos, bisnetos e noras... Todos idos para a cidade grande. É que lá poderiam ver o mundo. Não só ver, mas experimentar aquilo de que só ouviam falar no rádio.


Os pássaros canoros foram e voltaram e as folhas de Gertrudes, já amareladas, caíam pelo terreiro. Ginho filho, o menino - já moço - que anos passados se emocionava com a chuva, limpava o quintal com o ancinho todo final de tarde.


- Já falei pra painho que um dia me vou embora - resmungava ele, mas sentia-se culpado só de pensar em deixar os pais ali, esquecidos naquela terra.


Nesse tempo, já não se sabia muita coisa por ali. O avô falecera e não havia o silêncio sepulcral na hora das refeições. A gata Dinorá, já velha, nem queria saber de vigiar as galinhas ou de miar debaixo da cadeira do pai que, idoso, urinava pelos cantos da parede por ter desaprendido a utilizar o urinol. O pato assado nem era suculento que a mãe errava no tempero, as vistas cansadas tentando medir o sal e o alho. E a menina... Mãe de dois, casada com Elvécio, ida para a cidade aos 16. Nem ao menos a natureza se conhecia que a Gertrudes já dava mangas fora de época e o sol nem parecia seguir o mesmo ritmo, delongando-se por minutos a mais no horizonte a cada dia. Os pássaros, até mesmo eles, escassearam por ali e agora formavam nada mais que uma pequena revoada.


Ginho filho, anos depois, conseguira nos Correios da cidade vizinha, telegrafar uma carta para Dora, que veio com o marido e as crianças no Fusca buscá-lo para a cidade grande. Iria tentar a vida ali. "Ao menos, experimentá-la", pensava crendo ser o único a ter esta grande idéia. Disse ele:


"Irmã pt Todos partiram pt Estou so na casa pt Papai mandou dizer que te ama antes de partir pt Mamãe também pt Não escrevi antes que o correio é caro pt Enterrei no cemitério atrás da casa junto de vovô pe Quero ao menos experimentar a vida na cidade pt Sds"


Os filhos de Dora já eram crescidos. Joana e Ginho neto. E Ginho filho já se adaptara ao novo ritmo. Cidade grande, muito movimento. Assustava-se às vezes, logo no começo, com tanto corre-corre. Mais susto ainda tomava quando olhava para o céu em noites escuras, noites de "sem-lua", e não via as estrelas, apenas o clarão das luzes avermelhadas refletidas nas esparsas nuvens. Mais ainda, porém, surpreendia-se com como a chuva perdera o sentido: não molhava a terra e o cheiro de poeira, que era o que mais lhe tocava quando novo, tornara-se o cheiro vaporoso do asfalto da rua no final do dia.


Por insistência da irmã, entrara na escola já tardiamente. "Vai ser bom pra você arrumar emprego, Ginho", dizia ela. Em sua sala, conheceu Zefa, com quem criou profundos laços de amizade. Ginho filho e Zefa tornaram-se amigos inseparáveis, o que era incompreensível, posto que já tinham mais idade e poderiam bem casar-se. Mas não era desse amor que sentiam um pelo outro. Ginho filho chegou a dizer à mulher em uma ocasião: "é como se você fosse minha família sem sê-la de fato. Minha família de cidade grande!".


E entrou para a família "não-de-fato" de Zefa, que apresentou-lhe a vida desconhecida por ele. Os bares da cidade. Os recantos. As estações de trem. As escadarias customizadas dos bairros boêmios. As grandes salas de projeção com sons tridimensionais e os filmes antigos com imagens surrealistas que o deixavam maravilhado: "Quando eu era mais novo e via o sol se pôr, eu via essas cenas na minha cabeça tirando um cochilo encostado em Gertrudes no terreiro. Ficava lá até mainha me mandar entrar que o jantar estava posto", dizia ele.


Zefa, já sem saber a que apresentar a Ginho filho, teve a esplêndida idéia de apresentá-lo ao resto da família "não-de-fato" que tinha. Zefa nunca fora afeita à famílias "de-fato".


Nesse dia, combinaram de encontrar-se numa das ruas do Centro, que ela lhe apresentaria outro grande irmão "não-de-fato" e ele estava lá, na hora marcada, a espera do desconhecido. Suas mãos e seu rosto suavam e a cada vez que tentava limpar o suor da testa dava-se conta de que só se lambuzava mais com a água salgada de nervosismo e ansiedade que lhe saía pelos poros.
- Ginho, esse é Tenti, meu amigo - disse ela.
- Sim, Tenti. Prazer - e estendeu a mão que, apesar de já haver tempo que não trabalhava no roçado, ainda era bastante calejada. Onde vamos? Que tal ao "fassfudi"?
- Fast-food - corrigiu o rapaz em inglês impecável.
E partiram os três para a lanchonete mais próxima, onde Ginho pedira um sanduíche duplo com refrigerante grande e batatas pequenas. Já não era novidade para ele aquele tipo de comida, mas por ter passado boa parte de sua vida sem experimentar qualquer daquelas coisas, achava tudo maravilhoso. O tempero incomparável ao sal com alho de sua falecida mãe. Sem falar na agilidade! Sentia-se como que senhor de cada um daqueles atendentes a quem pedia em pensamentos: "Tragam logo meu sanduíche senão reclamo de vocês" ao mesmo tempo em que pedia humildemente: "Boa tarde, senhorita, poderia me dar um sanduíche duplo com refrigerante grande e batatas pequenas, se isso não lhe for muito incômodo?".
Ao ver esse pedido, Tenti riu-se e, percebendo o olhar furioso de Zefa, afastou-se, sentando em uma das mesas para contemplar de lá o show de estranheza que desfilava diante de seus olhos. Como poderia haver no mundo quem fizesse um pedido como aquele rapaz fazia?!
- E de onde se conheceram? Em algum show de peão? - perguntou Tenti ironicamente.
- Não, no supletivo - respondeu Zefa, sem perceber o tom do irmão "não-da-fato".
- É, minha irmã insistiu para que eu estudasse. Dei a sorte de conhecer uma pessoa tão boa quanto Zefa na escola. Quando eu era criança e ouvia no rádio de pilha de meu avô sobre livros e estudos, pensava como eram essas coisas - falou Ginho filho.
- Como assim?! Você não conhecia livros?! Pois deve estar brincando! Todo o mundo conhece livros! De onde você tirou esse cara, Zefa?
- Então, ele vem desse lugar muito, mas muito longe onde hoje acho que nem tem vida, certo? - direcionou ela a pergunta para Ginho.
- Sim... Bem, Gertrudes deve ter morrido já que estava velha e Dinora... Não acho que tenha tido filhotes.
- Gertrudes? É o que? A galinha de estimação da família? - disse Tenti em tom de deboche.
- Não! A árvore! - respondeu Zefa encabulada, já percebendo o tom subjacente nas falas de Tenti.
- Sim - confirmou humildemente Ginho, começando a notar que a conversa não parecia estar seguindo muito bem. Não sentia-se bem com aquele irmão "não-de-fato" que Zefa lhe apresentara. Não mais.
Ginho filho naquele dia compreendera o que seu avô disse uma vez na mesa, quando todos calavam-se: "Meus queridos, na vida há aqueles que conhecem o que é viver e aqueles que só leram sobre".

domingo, 8 de julho de 2007

Dos factuais I

Meu corpo é meu fato. Em sua concretude, me interpela e me fala baixinho, como que sussurrando palavras doces ao meu ouvido: "aceita-me ou te devoro", parodiando a esfinge de Édipo.

É que há a insegurança cotidiana e a possibilidade de que no mundo existam coisas muito melhores que meu próprio corpo. Gostaria de fazer plásticas e modificá-lo. De que nos vale o mundo senão para que possamos interferir nele?

Meu corpo é um fato, mas não é meu fato. É meu incômodo. Quero modificá-lo ou modificar a idéia que tenho dele.

Já tentei de tudo: de dietas a exercícios, de não vê-lo a contemplá-lo diante de um grande espelho. Tento ver através de suas carnes aquilo que sou, mas ele sempre se interpõem, colocando-se exatamente no meio do caminho entre o que sou e como me vêem. Não sou meu corpo, mas pensam que seja e temo que fique só por isso. Vejo a beleza que há por dentro das pessoas e me apaixono por elas, mas não há como garantir que farão o mesmo.

Apenas...

Feliz. Exactement.

terça-feira, 3 de julho de 2007

Cthulhu

Não leiam este post aqueles que procuram um conto, uma história, ou qualquer coisa do gênero. Nem será bem escrito (se é que os outros o são...). Mas é só que tenho essa idéia, essa coisa, e preciso colocar pra fora.

Sabe Cthulhu? Pois é, eu também não sabia. Mas agora sei. Vou retirar do mito apenas a parte do "Messias", de que tipo, Cthulhu era como um messias. E por ter tido uma educação católica, por Messias entederei algo bem como Jesus Cristo, uma parada muito "totalmente" foda! (Ps.: Não, gente, não virei evangélico... é só para vocês entenderem. Imagine que eu seja um daqueles caras que paga dízimo de salários inteiros e acredita em cada coisa que o pastor diz e faz o maior esforço para seguir aquilo porque quero ser como Jesus, entendem?).

Pois é... Não tenho amigos. Tenho Cthulhus.

Estou há mais ou menos uma semana tentando achar uma imagem. Esbocei uma tentativa naquele post por aí abaixo que fala sobre verdade, sobre relacionamentos coesos etc... Mas é que não consegui escrever lá. Acho que hoje achei a tal imagem. Mas não dá pra escrever um conto pq seria cafona. A vontade é de gritar isso da janela bem agora: tenho Cthulhus em minha vida! E como sou feliz por isso!