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sábado, 1 de setembro de 2007

A vida de Maria

Foi assim que Maria começou a viver: num dia de sol, um pombo acinzentado, sobrevoando a pista de corrida do Aterro do Flamengo, teve um taquicardia e despencou velozmente do céu ao chão, estabacando-se aos pés de nossa heroína, que corria como fazia todos os dias pela manhã.

Não... Não está bom! Maria deve ser uma mulher de 40 anos, faz cooper todas as manhãs no Aterro... Talvez seja uma executiva... Sim! Uma executiva. Bem sucedida, solteira... E começar a viver diante da morte é um clichê... Sim!:

Foi assim que Maria começou a viver: ao chegar em casa após mais um dia produtivo no trabalho, abriu a caixa do correio e encontrou o convite para o casamento de Arlete, aquela amiga de infância que Maria jurava que nunca ia ter pretendentes na vida.
Com o convite na mão, chamou o elevador. A respiração presa. Rompeu-se em lágrimas ao adentrar seu apartamento triplex na rua da praia: ela, Maria, era só.
"Você sempre foi uma moça tão casadoira, minha filha", dizia sua avó, "não entendo como todos as suas amigas se casam e você fica só...".

Ah! Pronto! Mais uma tentativa frustrada! Maria não pode ser uma mulher "casadoira"... É uma executiva, bem sucedida, decidida, objetiva. Maria, certamente, leria Marie Claire! Isso se não tivesse feito a faculdade de Economia e se convencido de que ser mulher era perda de tempo:

Foi assim que Maria começou a viver: no sinal, decidiu comprar uma água do ambulante e abaixou o vidro elétrico. Nisso, seus olhos bateram nos dela, nos de Gorette, que ia sentada ao volante do carro ao lado. Gorette, percebendo-se olhada e simpatizando com a figura de Maria, pegou um cartão seu no porta-luvas e, amassando-o para que melhor vencesse a resistência do ar e mais chances tivesse de alcançar o outro carro, arremessou-o.
O sinal abriu. O coração de Maria batia acelerado quando, lentamente, seus pés soltaram a embreagem e pisaram o acelador. O que fazer com aquele pedaço de papel que lhe arremessara a outra? Ela era solteira... Não era errado conhecer uma nova pessoa. E assim, decidiu ligar.

Mas Maria abre-se tão facilmente assim para os outros?! Ah! Maria é uma mulher que tem uma vida... E eu já me canso de tentar escrever sobre esta mulher tão comum! :

Foi assim que Maria começou a viver: num dia de chuva, num lugar descampado e com gramíneas verde claro, um grupo de pessoas chorosas e trajando preto olhavam a descida do ataúde. Por fim, uma meninita, talvez sobrinha da defunta que descia os sete palmos, jogara por sobre o caixão um ramalhete de rosas brancas e um pequeno cartãozinho onde se podia ler: "Maria, parta em paz para uma nova vida".

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